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Da Violência
Gil Cordeiro Dias Ferreira

Resumo:
Condenação à violência que assola o Rio de Janeiro

DA VIOLÊNCIA
Não conteremos a violência com frases de efeito, tais como " ela passou dos limites" , porque, ao fazê-lo, estamos tacitamente admitindo termos traçado limites de tolerância para ela, quando essa tolerância deve ser zero.
Não conteremos a violência com planos mirabolantes engendrados no calor de acontecimentos dramáticos - como o seqüestro do ônibus 174, já lá se vão ez anos - mas relegados ao esquecimento, tão logo baixe a poeira do tempo, que tudo apaga.
Não conteremos a violência com marchas, roupas brancas, velas acesas, discursos ao pé dos túmulos de vítimas inocentes, belos editoriais em periódicos, pronunciamentos políticos e quejandos - pois que a tudo isso os marginais fazem ouvidos moucos, e no minuto seguinte voltam a nos assolar.
Não conteremos a violência enquanto não demonstrarmos, por todos os meios possíveis, para aqueles a quem elegemos, que, ao fazê-lo, cedemo-lhes parte do poder que de nós emana - nossos direitos, sob a forma de votos e tributos - para que adequadamente gerissem nossos destinos - seus deveres. E se não os cumprem, cabe a nós, na melhor das hipóteses, exigir que o façam; ou, na pior, destituí-los.
Não conteremos a violência enquanto o Congresso Nacional não reformar nossas esclerosadas leis penais e abolir as aberrações jurídicas que privilegiam criminosos; enquanto o utópico Estatuto da Criança e do Adolescente não for ajustado à realidade nacional; enquanto os poderes constituídos, por serem incapazes de negar o acesso de marginais a armas pesadas, voltarem-se contra a posse de armas leves pela população honesta; enquanto não dispusermos de um Judiciário ágil, disponível 24 horas por dia, que se preocupe mais com a eficácia do que com o preciosismo semântico de suas sentenças e acórdãos; enquanto existirem maus advogados que se utilizem, quando a serviço de seus clientes, do privilégio de serem "invioláveis quando a serviço da Justiça"; enquanto existirem Governadores e Prefeitos pusilânimes, que hesitem em aplicar a força onde e quando necessária, pelo receio infundado de perderem votos; enquanto existirem indivíduos e instituições que ofereçam fortes resistências às tentativas governamentais de implantação de políticas de planejamento familiar; enquanto os indivíduos e instituições defensores de direitos de criminosos existirem em maior quantidade do que os voltados para as vítimas; enquanto houver, dentre os ricos e poderosos, viciados em diferentes tipos de drogas, capazes de tudo para não ficarem desprovidos delas; enquanto houver indivíduos e instituições insistindo demagogicamente na descriminalização das drogas; enquanto não harmonizarmos as Polícias e priorizarmos mais os homens que as integram do que os armamentos, equipamentos e viaturas que utilizam; enquanto não investirmos maciçamente no sistema penitenciário, e enquanto os responsáveis por este quiserem nos impingir a falácia de que ignoram como, ou não são capazes de impedir que armas, munições, celulares e drogas cheguem às mãos de apenados; enquanto os meios de comunicação exacerbarem o consumismo desenfreado, a sensualidade sem limites, o afrouxamento moral, o "liberou geral", a banalização da transgressão; enquanto os cidadãos de bem estiverem sitiados em suas cidades pelos marginais que derrotam e acuam os poderes públicos, e estes - por impotência, leniência, conveniência e até mesmo conivência - tudo nos exigem, mas nada nos retribuem; enquanto tivermos de assistir, horrorizados, à desfaçatez com que políticos dos três poderes, das três esferas, por nós eleitos, apropriam-se de recursos advindos de nossos tributos, e permanecem impunes, em eloqüentes exemplos logo seguidos por marginais de todos os matizes; enquanto a ausência do poder público junto aos mais necessitados continuar a favorecer o surgimento, entre eles, de pseudo-Robin Hoods modernos, que, acenando-lhes com a ameaça da violência insana, impõem-lhes a lei do silêncio e a mesma nefanda “proteção” outrora ofertada por Al Capone e outros gângsteres, fazendo deles seus frágeis e descartáveis escudos, diuturnamente vazados por balas, nem sempre perdidas, ou retalhados a machadadas.
Não conteremos a violência enquanto persistir a impunidade dos agentes públicos corruptos, detentores ou não de mandatos eletivos, concursados ou apadrinhados, do senador ao vereador, do magistrado ao agente penitenciário, do policial federal ao guarda municipal, do graduado servidor federal ao humilde barnabé, tanto quanto dos colarinhos-brancos que os corrompem.
Talvez ainda haja tempo de reverter o caos em que nos encontramos, sem abrirmos mãos dos princípios democráticos que nos regem. Mas dentro em pouco, a persistir esse progressivo esgarçamento do tecido social, talvez não nos seja mais possível fazer imperar o Estado de Direito, senão pelo emprego da violência contra a violência; pela intervenção, pela suspensão de garantias individuais, pelo estado de sítio, pela guerra civil, pelo fuzilamento sumário, pela invasão de presídios, pelos expurgos à moda de Hitler, Stalin, Saddam Hussein, Kadhafi, Khomeini, Fidel Castro e outros monstros; enfim, por mais uma demonstração ao mundo de que, em que pesem tristes experiências passadas, ainda não estamos aptos a gerir nossos próprios destinos.
Entrementes, a persistir esse estado de coisas, só nos restará estampar em grandes "outdoors", em todos os pontos de entrada do Brasil, a frase que, segundo Dante Alighieri, adorna o portal de entrada do Inferno:
Lasciate ogni speranza, voi ch’entrate !
   


Biografia:
Brasileiro, casado, nasceu no RJ, em 06/09/1946. É Oficial de Marinha (Escola Naval, 1967) e Administrador (UNESA, 1996). Passou à reserva em 1996 e, desde então, trabalha na iniciativa privada, como Administrador e Consultor. Tem mais de sessenta trabalhos publicados sobre assuntos militares, história, geografia, política e ficção, em periódicos especializados e jornais do RJ e de MS. Conquistou vários prêmios literários e, em 2000, o Clube Naval editou seu livro “Coisa de Naval”. Tem livros à venda nos sites Clube de Autores, AgBook, Recanto das Letras e Bookess.
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