O Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência foi criado para coincidir com o quase esquecido Dia da Árvore em 21 de setembro, representando o nascimento de reivindicações para cidadania em igualdade de condições e inclusão.
A celebração por este dia foi tão fraca, que se ele fosse excluído do calendário poderia passar despercebido, anulando o Censo de 2010, que revelou a existência da tragédia brasileira ao apontar mais de 45 milhões de pessoas com deficiência, e eu por vergonha não me recuso projetar o acréscimo dos autistas nos últimos seis anos, que nas estatísticas oficiais ainda são considerados invisíveis.
Dificilmente o mundo esquecerá os esforços dos paratletas competindo na Paralimpíada, unidos em mente, corpo e espírito de luta. O som emanando pelos dedos renascidos do maestro João Carlos Martins ao piano, e a magnífica interpretação do tenor Saulo Laucas, cego e autista do Hino Nacional, foram provas incontestes da existência divina, uma inspiradora forma concreta de como devemos ver as habilidades e talentos das pessoas com deficiência, cada uma no seu jeito de ser.
Dias depois, em entrevista ao canal de TV Globo News, em sua primeira semana na presidência do Supremo Tribunal Federal (STF), a ministra Cármen Lúcia expressou que a sociedade poderia esperar empenho dos ministros, porque eles “não eram autistas, e sim cidadãos”.
Houve uma mobilização de interessados na causa autista, entre eles os pais, o Movimento Orgulho Autista do Brasil, a OAB - seccional de Brasília, ONGs, e associações com críticas, algumas exacerbadas contra o deslize da ministra em nível nacional, que diante da reação negativa divulgou um pedido de desculpas.
Disse a ministra Cármen Lúcia em sua nota, que reconhece o mau uso da palavra “autista” e destacadamente: “sem qualquer motivação de ofensa ou desqualificação – à condição autista, dizendo que recebeu “manifestações – justas e motivadas – de que o uso era indevido e poderia ser interpretado como ofensivo.”.
E mais: “Peço desculpas por isso e esclareço, ainda uma vez, que jamais tive qualquer intenção de ofender ou de manifestar discriminação” e mais, afirmando que tem “experiência familiar” embora não citando o grau de parentesco.
A delicadeza da ministra serviu de alento, porém não aliviou as dores da imensidão de pais ressentidos com o impacto da afirmação, pois esperavam mais dela como autoridade máxima da mais alta corte de Justiça, e ainda como pessoa pública de notório saber, exemplificasse para o país o que é preconceito e discriminação à luz das leis pró-autistas, vigentes.
O candidato mais cotado nas pesquisas para ser prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella e também senador da República, ao responder à Rádio CBN se manterá as mudanças nas linhas de ônibus e o que fará a respeito das vans, respondeu afirmativamente: ...“Não vou ser governo autista, essas coisas todas precisam ser feitas”...
A comunidade protestou contra a arrogância do candidato, pelo mau uso da palavra de forma pejorativa, demonstrando total preconceito ao ofender os autistas, relacionando-os em um assunto totalmente fora de propósito.
Para se retratar o senador divulgou um vídeo dizendo que: "Gostaria de pedir desculpas por um descuido durante uma entrevista, na qual usei a palavra autista de forma inadequada. Em nenhum momento tive a intenção de ofender. O combate ao preconceito começa quando temos a humildade de admitir que erramos. Por isso, reitero minhas desculpas.", embora estivesse reincidindo, pois nas eleições anteriores chamou o prefeito Cesar Maia de autista, ratificando o hábito de mau uso da palavra com discriminação e preconceito.
Sem dúvida a Paralimpíada trouxe visibilidade e oportunizou comprovar nossa eficiência, para o mundo, não só pura e simplesmente pelo conceito, mas sim, pelo contexto de que as pessoas vivem em nível constitucional no Brasil, e os autistas além de serem pessoas com deficiência, são cidadãos, conforme a Lei 12.764/12.
Não vi ou não percebi em face da massa de informações, a Secretária Especial dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Ministério da Justiça e Cidadania, Rosinha da Adefal emitir opinião ou se manifestar no decorrer do episódio da Presidente do Supremo Tribunal Federal-STF e do candidato a prefeito de uma das maiores cidades do Brasil.
Pais de autistas de todo o Brasil formam uma comunidade forte, porém pulverizada e com pouca força política, pois tendo em vista os cuidados às suas famílias, são afetados de diversas formas pela dedicação aos filhos, ficando abandonados pelo sistema ineficiente por falta de políticas públicas, e impedidos de contribuir para o crescimento do país.
Os autistas não constituem uma classe diferenciada de pessoas. Autista não mora em outro lugar, não tem outra mãe e não é outro filho, também é um cidadão. Não nos cabe fazer juízo de valor para o que eles são, mas sim prosseguir na luta para que eles não sofram mais do que o inevitável.
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