Havia peras, figos, maçãs e uvas naqueles quintais maravilhosos da mansão daquele amigo.
No primeiro, os parreirais com uvas pretas, brancas e rosadas, que eram colhidas e refrescadas para serem servidas após o almoço. Muitos cachos, cuidadosamente colocados em pratos de porcelana branca ( as estampadas competiriam com a beleza das uvas) eram ofertados aos vizinhos, apenas os eleitos para um convívio posterior ou já existente.
Aqueles, que não recebiam esses presentes , estavam condenados a ser apenas moradores da mesma rua. Muitos se amarguravam por isso, outros nem percebiam ou nem ligavam para a situação.
Embora minha família não fosse agraciada com a porcelana branca, após o almoço, eu nada entendia a respeito. Comia as uvas no parreiral de cima, as peras nas árvores do andar de baixo, ao lado do meu amigo que, hoje tenho certeza, me amava como tal. E examinando minha conduta , me parece que eu era estomacal, gastronômico e muito pouco cordial, talvez indiferente.
Hoje entendo que o amor desobedece e desconhece todos os andares dos quintais dos seus pomares. Como uvas ( até não gosto muito) ao lado dos brilhantes e das vassouras e me penitencio por não ter valorizado o amor que me foi brindado na luminosidade, não percebida, da minha infância.
Rio, 04/10/2019
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