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CONVERSA DE BÊBADO
Rubemar Costa Alves

“Se hay gobierno, soy contra!” Não sei quem disse...
          Li em algum lugar que adiantar uma hora no relógio foi idéia de um americano, o político e cientista BENJAMIM FRANKLIN, em 1784, mas sempre existem os “só-de-raiva-sou-contra-qualquer-coisa-que-o-“outro”-inventou-e-ficou-famoso”, e assim apenas em 1916 efetuou-se o assunto na Alemanha, meio da Primeira Guerra Mundial, pela necessidade de se economizar carvão.
          Absolutamente, EU não vou questionar a eficácia ou a eficiência de tal medida. Nem se este ou aquele governo impõe isto ou aquilo e temos que obedecer.
          Desagradável, sim, para quem sai de casa para trabalhar às cinco e meia da manhã no horário do relógio, mas no horário da natureza ainda é “noite” e até amanhecer de verdade, bota tempo nisso... Entretanto, é gostoso para a turma do litoral largar o expediente de trabalho às cinco no relógio, quatro na natureza, horário ainda para uma boa praia de segunda a sexta, o que já se torna mais difícil fora deste período especial. Praia, planalto ou montanha, os donos de bares devem sorrir de orelha a orelha: “Mais um chopinho, freguês?” Comprovada a economia de energia, por que ser contra à toa?
          Terminei a aula noturna e fui para o ponto de ônibus, cerca de dez da noite.
           Surgiu um BÊBADO, andar desengonçado. De A a perto de Z, mas fora da ordem alfabética, me fez vários pedidos. Intercalava pedidos e uma risadinha sem graça. Ah, e misturava assuntos também.
          “Moço, o senhor tem fósforo?   Rsrsrs. Sabe quando o São Paulo vai jogar contra o Flamengo? O senhor tem por acaso aí uma camisa velha que não queira mais? Rsrsrs. E palito de dente, o senhor tem? Rsrsrs. Hoje em dia é tudo computador. Eu já fui casado, mas a minha mulher cozinhava muito mal e acabou me largando... é... foi trabalhar num hotel. Rsrsrs. É, hotel de “granfa”, eu não falei motel porque eu sou religioso - não bebo, não fumo, não jogo, não freqüento certos lugares... O meu amigo padre, o senhor conhece ele também, eu sei, me disse que...”
          Não passava ônibus nenhum.   Nem táxi.
          “Moço, o que é que eu estava falando mesmo? Ah, sim, eu ia perguntar se o senhor tem uma caneta ai. Rsrsrs. Bom, lápis também serve. Anotar a chapa deste carro que passou agora. No bicho eu jogo, sim senhor. Fazer a fezinha, como se diz... Já escolheu seus candidatos para votar? Rsrsrs. Tem gente que come peixe cru. Eu não sou jacaré... Quando eu era garoto, caí e quebrei o braço.”
          EU calado estava antes dele, calado continuei.
          “O senhor não está gostando da minha conversa ou não escuta nadinha?” Rsrsrs. Fez gestos para mim que identifiquei como linguagem de sinais das pessoas surdas-mudas.
          Mudou o tom de voz, afirmou ter se formado em curso superior (possível), licenciatura em História (possível), aprendeu a linguagem com namorada (possível), chegou a dar tais aulas em curso especializado (possível), mas...................
          Não continuou.
        “Pois é, meu senhor... Posso chamar de você? Devemos ter a mesma idade. Pouco mais de 40, não é, patrãozinho?! Pois é. Você... Tá vendo? Se não fosse este horário de verão, é, pois é, seriam nove horas e não dez da noite... Muito ruim.”
          Afinal, o ônibus não vinha, resolvi conversar.
          “E qual a diferença?”
          “Diferença de sessenta minutos, uma hora, moço. O senhor não sabe fazer conta, não? Já foi muuuuuito inteligente... bem mais esperto...”
          “Certo, mas o horário de verão é em função do sol. Às nove ou às dez da noite o sol não aparece...”
          Gracejou. “O sol nesse momento está lá no Japão comendo sushi e sashimi...”
          ELE riu, concordou. E para minha surpresa, sem risada alguma, falou direitinho sobre o ‘inventor’ do horário de verão, vantagens e desvantagens, na sua própria linguagem uma “filosofia econômica”.
           Fora de propósito e de ocasião, mas ELE pronunciou quase aos gritos a frase fatídica:
          “Se hay gobierno, soy contra!” - disse que ouvira da boca do próprio Che Guevara (impossível) que estivera no Brasil em... 1961 (pesquisarei)...
          Nasci em 1967, ano da morte de Guevara. ELE certamente perto disso.
           Ia passando um táxi, acenei, apertou a minha mão e soltou a máxima final:
          “Os grandes só parecem grandes porque estamos ajoelhados. Frase do Che! Boa noite, professor RUBEMAR!” Eu me senti um nada diante daquele homem.
          Quem era ELE e de onde me conhecia? Tive uma bruta insônia.


             F   I   M


          




Biografia:
PARVUS IN MUNDUS EST. (O MUNDO É PEQUENO DENTRO DE UM LIVRO) Ser dedicado, paciente, ousado, crítico, desafiador e sobretudo enlighned são adjetivos de um homem cosmopolita que gostaria de viver mais duzentos, ou quem sabe trezentos anos para continuar aprendendo e ensinando. Muitos de nós acreditam que uma vida de setenta, oitenta anos é muito longa, contudo refuto esse pensamento, pois estas pessoas não sabem do que estão falando. Sempre é tempo de aprender, esquadrinhar opiniões, defender, contestar ou apoiar teses, seguir uma corrente filosófica (no meu caso, a corrente kantiana), não necessariamente crer num ser superior, mas admirar e respeitar quem acredita nele. Entender a diversidade de costumes e culturas denominados de forma polissêmica nas diferentes partes do mundo, falar um ou dois idiomas, se perguntar o porquê e tentar encontrar respostas para as guerras, a segregação racial, as diferenças étnicas, o fanatismo religioso, o avanço tecnológico, o entendimento político. Enfim, apenas estes temas já levaria uma vida para se ter uma compreensão média. A leitura é o oráculo para estas informações, é ela que torna o mundo cada vez menor capaz de se acomodar nas páginas de um livro. É por isso que se diz que não há fronteiras para quem lê. Atualmente as pessoas confundem Balzac com anti-inflamatório, Borges com azeite, Camilo Castelo Branco com rodovia estadual, Lima Barreto com laranja de determinado município paulista, Aristóteles com marca de carro e por aí vai. Embora, eu tenha dissertado sobre o conhecimento culto, os meus trabalhos publicados aqui demonstram o dia a dia das pessoas comuns narrados através de divertidas e curiosas estórias. Meu público alvo são as mulheres. É para elas que escrevo, pois são elas possuidoras de sensibilidade capaz de entender o conteúdo do meu trabalho.
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