Login
E-mail
Senha
|Esqueceu a senha?|

  Editora


www.komedi.com.br
tel.:(19)3234.4864
 
  Texto selecionado
Na floresta
José de Aguiar Junior

Resumo:
Mostra da vida noturna, entre os animais, em uma floresta, onde há presas e predadores, que se unem para o bem comum e manutenção da vida.

Era uma noite clara, com a lua nova bem prateada iluminando o grande lago formado pelas chuvas torrenciais que haviam derramado toda a fúria da natureza no período vespertino, os raios ceifaram alguns grandes e velhos eucaliptos que ao caírem foram quebrando as árvores menores. A chuva caiu no começo de uma tarde modorrenta, de um calor insuportável e um abafado sufocante. Depois da chuva o vapor d'água que subia do solo da floresta fazia cozinhar a carne, tal como se fosse um grande caldeirão. Algumas árvores se incendiaram com os raios, esfumaçando o final da tarde que se misturou com o cair da noite, emprestando uma atmosfera ímpar, como um lugar mágico, outra dimensão. Já adentrava a madrugada, os vagalumes sobrevoando a mata iluminando-a em verde, mariposas escuras e outras brancas saindo de seus casulos, morcegos gigantescos acordando vorazes e sedentos, buscando suas presas alimentares. Alimentam-se eles de pequenos insetos. Pequenos roedores, pacas e veados se achegando ao lago para beberem água e afagarem o calor. É madrugada, os morcegos enfastelados voando em velocidade e desviando de árvores, emitindo um assobio estridente, fino, alto e que fazia eco em meio da floresta. Os animais pequenos que se refrescavam próximos da água voltavam para trás suas orelhas, como se desconfiados da presença de algum predador. Um forte estrondo na água afugentou os roedores que rapidamente deixaram o lugar. As pacas em estardalhaço se embrenharam na mata e desapareceram.
Passados alguns instantes a vida na floresta voltava ao mormal, era apenas uma grande copa de árvore que caíra lá do alto, mais de trinta metros de altura, talvez vitimada por uma descarga elétrica advinda de um raio.
Na noite seguinte e sob o mesmo luar os viventes da mata retornaram para o lago para se refestelarem do abundante alimento. Frutos para os herbívoros, insetos para morcegos e marsupiais, peixes para os animais que se aventuravam na água, tal como lontras. Vagalumes e mariposas bailando no ar, riscando o céu de um verde vivo ou fazendo brilhar as asas espessas e prateadas à luz da grande lua. A floresta é viva, esbanja vida e dá alimento a todos os seres, nenhum deles com maldade na conduta e olhos, nem mesmo os morcegos que apenas estão em meio a uma cadeia alimentar; os marsupiais que se alimentam de larvas e insetos encrustados em árvores também não guardam maldade, é a vida que vai e se mostra. No meio das águas, claras apenas com a luz da lua, algo serpentiante, fazendo pequenas ondas e sem barulho pode ser percebido apenas pelos animais mais diligentes. Outros, distraídos e desavisados, tal como os filhotes de roedores e pacas, não se dão conta do perigo que correm, e prosseguem brincando e se refrescando na beira do lago. A água do lago para, nada se vê, nenhum movimento ou ruído. Repentinamente um animal aquático, um réptil, talvez, projeta seu corpo rapidamente e tenta abocanhar um pequeno animal, mas sua tentativa falha ao ser obstado por um tronco de árvore que desaba no exato instante, salvando a presa e deixando-o a míngua. Todos fogem em polvorosa para o seio da floresta, sem entender o que aconteceu e sem se darem conta de que o estrondo não foi da caída do tronco de árvore, mas sim, da batida do abdômen do animal na água. Segue a vida, seguem-se dias e noites, num temperamento tranquilo, dócil e incorrupto na vida animal. Amanhece novo dia, seco, modorrento insuportável, quando a tranquilidade da floresta é quebrada por ruídos e estrondos. Não, não se tratava de mais uma tempestade de verão; desta vez eram máquinas, de ferro e aço, articuladas e com braços fortes o bastante para rasgarem a proteção natural da floresta, traziam para aquele ambiente equilibrado e puro o desequilíbrio, a desesperança e a perturbação progressiva. Em um dia apenas foram ceifadas mais de uma centena de carvalhos centenários, árvores frutíferas, fonte de alimento e abrigo para tantos viventes inocentes da floresta, lagos soterrados e tocas aterradas. A vida foi tumultuada a ponto de causar pânico entre as espécies. O inesperado e inexplicável ocorreu: próximo do antigo lago e numa clareira aberta pelas máquinas, de onde era possível ver o céu noturno, milhares de pontos brilhantes e a lua mais prateada que já se viu, começaram a chegar os animais da floresta, eram lobos, felinos, marsupiais, lontras, macacos, cobras, vieram até os morcegos, com suas grandes asas imponentes e dentes brancos, grandes e afiados. Os olhares naquela noite não eram de predadores e presas, não havia medo e nem se pôs à frente a cadeia alimentar. Olhos tristes, destinos incertos, dúvidas e incertezas permeavam a reunião. Ao final da noite e já no raiar do dia, cada ser da floresta seguiu um caminho. As cobras se enrolaram sob os bancos dos tratores, os felinos se ocultaram próximos dos acampamentos, os macacos se armaram com cocos. Os morcegos e as mariposas ficaram com a noite. Naquele dia os trabalhadores não conseguiram prosseguir na sua missão destrutiva, as cobras os assustaram, dando botes em direção à eles, mas sem feri-los, os macacos atiravam cocos pequenos nas tendas e nas máquinas, enquanto os felinos rosnavam e preparavam o ataque. Todos correram e se esconderam durante o dia inteiro no interior de um casebre de madeira que haviam construído na clareira. Chegada a noite os morcegos gigantescos e as mariposas começaram a voar e bater no telhado do casebre e nas tendas armadas. Voavam em direção dos trabalhadores, assustando-os com seus dentes afiados; as mariposas fasfalhavam suas asas fazendo um zunido assustador. Naquela noite ninguém dormiu. No dia seguinte e nos outros dias, mais de uma lua, os animais da floresta agiram da mesma forma, até conseguirem expulsar os invasores e suas máquinas. Passaram-se anos e a floresta se recompôs, as árvores cresceram e as forrageiras retornaram. A vida na floresta voltou ao normal, presas e predadores, mariposas rompendo casulos, morcegos dando voos rasantes e rápidos, predando insetos, vagalumes iluminando a noite. Mais uma tempestade e nova inundação de parte da floresta; lagos formados e répteis prontos para o bote, felinos a espreita e presas ansiosas e com cautela. A vida se recompôs na floresta, pronta para nova investida agressora.


Biografia:
José de Aguiar Junior, paulistano, escritor de contos, histórias e crônicas.
Número de vezes que este texto foi lido: 52821


Outros títulos do mesmo autor

Contos Na floresta José de Aguiar Junior
Ensaios Dè já vu José de Aguiar Junior
Poesias A LUA José de Aguiar Junior
Contos Fruto da real imaginação José de Aguiar Junior
Crônicas Apenas uma nota José de Aguiar Junior
Contos SONHOS E SEUS ENÍGMAS José de Aguiar Junior
Poesias Reflexão José de Aguiar Junior
Ensaios Ser estranho, na visão de outra espécie José de Aguiar Junior
Ensaios A aceitação da própria condição José de Aguiar Junior
Ensaios Meditar é necessário José de Aguiar Junior

Páginas: Próxima Última

Publicações de número 1 até 10 de um total de 12.


escrita@komedi.com.br © 2024
 
  Textos mais lidos
JASMIM - evandro baptista de araujo 68892 Visitas
ANOITECIMENTOS - Edmir Carvalho 57830 Visitas
Contraportada de la novela Obscuro sueño de Jesús - udonge 56644 Visitas
Camden: O Avivamento Que Mudou O Movimento Evangélico - Eliel dos santos silva 55697 Visitas
URBE - Darwin Ferraretto 54920 Visitas
Sobrenatural: A Vida de William Branham - Owen Jorgensen 54735 Visitas
Entrevista com Larissa Gomes – autora de Cidadolls - Caliel Alves dos Santos 54727 Visitas
O TEMPO QUE MOVE A ALMA - Leonardo de Souza Dutra 54641 Visitas
Caçando demónios por aí - Caliel Alves dos Santos 54630 Visitas
ENCONTRO DE ALMAS GENTIS - Eliana da Silva 54550 Visitas

Páginas: Próxima Última