Eu, no auge dos meus 8 anos, já era uma criança impregnada do machismo que a sociedade e a família tratam de enfiar guela abaixo logo que a gente nasce. Era aquela menina meiga, tímida e educada, que todas as pessoas elogiavam pelo comportamento exemplar. Comportamento esse somente esperado de meninas, lógico. Até que, um dia, entrou uma menina nova na minha sala, e a coitada logo foi taxada por todos, incluindo eu, de “puta” (não, naquela época nem ela nem ninguém ainda sequer beijava na boca). Essa menina, que vou chamar de J., era extrovertida, alegre, expansiva, segura, audaciosa, vivia rodeada de gente. Ou seja, tudo que eu queria ser e nem sabia que podia. Então, um dia, simplesmente decidi que iria ser puta também. Automaticamente, me vesti da cabeça aos pés de toda auto estima, audácia, alegria e sociabilidade que eu pude, me sentindo a menina mais linda e legal do mundo, tentando chegar o mais perto possível do que J. era.
Lembro do dia em que quis ser puta como um dos mais libertadores da minha infância. Lá, na terceira série, eu já tinha descoberto que, na nossa cultura machista e misógina, ser considerada puta significava ser tudo o que não querem que a gente seja: livres, donas de si, empoderadas. Se eu posso dar um conselho a todas as meninas e mulheres esse conselho certamente é, sejam como a J.! Sejam putas, sejam rebeldes, sejam tudo aquilo que te dizem para não ser.
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