O povo paulistano está prestes a perder sua mais ostentosa livraria: a famosa Livraria Cultura no Conjunto Nacional na Avenida Paulista com a Rua Augusta. A decretação de falência pela Justiça de São Paulo começa a colocar fim em ponto histórico na procura por livros novos. As lojas poderão ser lacradas. A Livraria Cultura poderá recorrer da decisão mas será difícil. Torcendo para que ela possa continuar sua recuperação judicial que dura mais de década. A pergunta que não quer calar é a seguinte: o que faz uma livraria do tamanho da Cultura fechar? Precisamos responder isto.
O Brasil não tem o hábito de ler. Isto é sabido faz décadas. Pessoas preferem outras formas de lazer e obtenção do conhecimento. Optam por vídeos rápidos, palestras, seminários e a maioria se contenta com pouca informação. Não é surpresa a saída da FNAC do Brasil, a decretação da falência da Cultura e a situação crítica de outras redes de livrarias como a Saraiva e Martins Fontes, o fechamento da loja física da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo na Rua XV de Novembro e a pouca presença populacional na livraria da Unesp na Praça da Sé. Ainda existe outra livraria no Shopping Light na Rua Xavier de Toledo com o Viaduto do Chá. Há ainda a Livraria Curitiba no Shopping Tucuruvi e a Lafonte no Shopping Trimais que vivem com mais funcionários que leitores(as) em busca de obras. Os sebos sentiram também esta crise. Eu sou frequentador assíduo destes locais e confesso que estou assustado.
O problema não é o fechamento da loja física em si e sim a constatação que mesmo havendo mudança para o mercado digital a situação fica inalterada. Nota-se a perda do hábito da leitura de livros e sim apostilas curtas e muito resumão. Resumindo: tudo mastigado e sem complexidade. O problema que isto afeta muita coisa na sociedade. Livros ficam mais caros, lojas são fechadas, mais gente demitida, formação ruim de profissionais, economia com baixo valor agregado, dificultam Mestrados e Doutorados por dificuldades em achar obras de referência que raramente encontramos em bibliotecas públicas, menos formação acadêmica e baixos salários porque geram-se empregos ruins! É preocupante detectar que redes sociais são o passatempo no Brasil diante de uma população que recebe mal porque não estuda e pouco lê!
Tudo isto vira uma bola de neve em outros setores da Economia. Editoras venderão menos e terão que adaptar-se. Empresas que vivem próximas de livrarias poderão fechar. Universidades poderão perder alunos(as) porque as obras disponíveis para estudos tornam-se mais difíceis de serem localizadas com a criação de cartéis online para venda de livros, ou seja, a situação tende a piorar ainda mais no Brasil em termos de qualidade de vida e promoção da igualdade. Certas obras não são encontradas em sebos como lançamentos e livros técnicos atualizados.
A leitura em PDF online também é complexa. Eu consigo ler no máximo 30 páginas online ao dia sendo que com livro físico leio até 100. Não é uma questão de adaptação e sim uma questão de saúde ocular. Piorando a situação, o celular não é o instrumento mais adequado para uma leitura mesmo com a função pinça. No caso de texto em PDF é preciso uma tela maior tipo tablet, notebook ou PC. Há também a capacidade de memorização. Bater o olho numa página em papel parece facilitar mais do que percorrer uma página em tela. A mente fica mais propícia para a assimilação. O outro grande problema é a demanda por energia elétrica e baterias. Esta desculpa da adaptação é uma forma de afastar leitores(as) porque a maioria não sente-se convencida diante de um PDF ao invés de um livro físico que pode ser tocado como um bem tangível tendo mais páginas bem confeccionado.
Já estamos sentindo o problema da falta de leitura quando procuramos emprego. Pessoas são submetidas em provas eliminatórias e grande parte é descartada mesmo precisando tirar a nota para garantir a vaga já disponível à mesma. É lastimável. Fazer Redação, nem pensar. Empresas poupam seus selecionadores pela má escrita ou erros em Língua Portuguesa dos(as) possíveis candidatos(as). No fundo, estamos empobrecendo a sociedade, a Economia e a formação de bons profissionais ao mercado de trabalho. Isto será cobrado no futuro. O desinteresse pelos estudos e a evasão escolar dizem muito em relação ao estímulo à leitura. Normalmente, quem para de estudar também para de ler sendo verdadeiras exceções quando continuam.
Voltando à Livraria Cultura é preciso dizer que a cidade de São Paulo não perde somente a maior loja de livros da cidade e a mais ostentosa no ramo. Ela perde um patrimônio cultural da maior relevância, um local de lazer, um ponto para debater sobre livros, há um teatro interno na livraria para apresentações que será fechado por tabela. Infelizmente, o negacionismo associado com a ascensão da ignorância como trunfo, está levando ao fechamento de livrarias físicas. Um povo que não lê será dominado pelos maus políticos. Estrangeiros tendem a ocupar os melhores postos de trabalho no futuro. São Paulo, a terra da garoa e agora das enchentes, vai empobrecendo. Quem quiser ler e estudar que adapte-se. Já imaginou você sendo operado por um médico que formou-se por apostilas e resumões? Você confia? Tomara que a Livraria Cultura recupere-se logo. Assim seja mesmo com a falência decretada. Só lembrando, há outra unidade em Porto Alegre. Lamentável perdermos livrarias, lamentável.
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